domingo, 28 de fevereiro de 2010
Frankestein Íntimo
- Mentira. - seca - Você nem tem mais isso.
- Ok, isso me pegou...
- Só que vou lhe dizer uma coisa. Você finge bem pra caralho.
- Não é bem assim, Broto. - chamava todas assim - Eu me apaixono, você sabe disso...
- Você diz isso! - letras capitais - Só que não é a "paixão" que a gente quer que seja. Não que você minta, mas nem você mesmo sabe o que se passa nesse seu coração. Ai. - suspirou - No fim não passa de um pobre diabo...
- Puxa, sua mãe nunca lhe ensinou que sinceridade demais pode ser falta de educação?
- Já temos essa intimidade e nem me venha com esse olhar de cachorro sem dono.
- Ai meu pai, o que que eu falo pra você?
- Nad... uhmmmmmm - e o beijo calou a discussão, que só aumentava o hiato do prazer.
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
Abreviações
Pronto, ele já entregara a “caixinha de divórcio” à ela. Tirar da vista os vestígios físicos dela era necessário para recomeçar a vida. Não devolveu os presentes, o que seria indelicado, mas as coisas dela – da escova de dentes até a lingerie favorita – deveriam ir embora com ela. Ele tinha uma cicatriz que fez quando foi ampará-la num tropeço que ela deu quando faziam uma trilha. Ficava num lado das costas. Quanto à este vestígio ele não sabia ainda o que fazer, mas estava pensando numa tatuagem pra cobri-lo. O encontro era para isso, se livrar destas coisas. Apenas.
Ela achava que devia pelo menos dar as caras para ele, depois de que começou a sair com um cara que conheceu no curso de pintura e apenas ligou para dizer que tudo acabara e que já estava com outro. Faltou coragem para vê-lo arrasado, como sabia que ele ficaria ao ser dispensado. Era hora de encará-lo. Uma atitude digna, finalmente.
- Você não tem nada a dizer? Digo, além das recomendações para o Flok – o poodle que ele lhe deu no aniversário de três anos de namoro.
– Uhm. Não.
– Não mesmo? Puxa, passei dias me preparando para isso. Você só queria me dar a caixinha?
– Bom, tem uma coisa sim. Aquela mensagem que você me mandou...
Ela sabia que devia tomar mais cuidado. Esperar um pouco mais antes de marcar o encontro. Escrever de modo mais frio. A mensagem que enviara no celular parecia com as que ela mandava no tempo em que estavam juntos. Fez tudo automaticamente. Que mancada. O lugar também foi uma falta de sensibilidade. Onde eles tomavam mate juntos ali, no fim da tarde. Quase toda tarde...
– Olha, eu não quis dizer nada de mais com ela, tudo bem? Foi só para a gente combinar de se encontrar. Se foi cedo demais...
– Não, não é disso que eu estou falando. Você lembra como ela terminava?
– Ãh? Er... “Beijos”?
– Sim, mas pega o seu celular aí. Isso, olhe só como está escrito.
Oi podemos nos encontrar hj no super mate da pça dos cisnes? 18h. Sdd. Bjos.
– Vê esse seu “Bjos”?
– O que é que tem?
– Nunca mais faça isso. Beijos são para serem dados inteiros. Não é a toa que ele é parte inevitável no intercurso do amor! Abreviar um beijo é como... Uhm... – olhou para cima – Compor um martelo agalopado sem o último peônio.
– O que?! – Ele se esquecia ás vezes que nem todo mundo era formado em Letras ou escrevia poesias, como ele. Ela sempre implicou com isso, mas, por outro lado, também aprendia muito.
– É como ir à Cuzco e não passar por Machu Picchu. – Ele só queria se fazer entender. Ela que fosse num dicionário descobrir o que é um peônio.
– Entendi. Nossa mas...
– Sabe, algumas coisas não se deve abreviar. Beijos, sexo, amor são as principais. Sentimentos
– Que bonito isso... – Piiii , apitou violentamente o celular. Era uma mensagem do novo namorado perguntando se ela chegaria na Temakeria à tempo. – Nossa, foi ótimo te ver, mas eu preciso ir.
Levantou-se rápido e ficou na dúvida se lhe dava ou não um beijo na bochecha. Não lembrava de tê-lo feito nos últimos quatro anos. Para que se tinha a boca? Passado um instante constrangedor, ajeitou a bolsa no ombro e saiu caminhando em passo firme, tomando cuidado para não tropeçar com a sandália de salto que escorregava nas pedras do caminho.
– Tchau! – Ele acenou enquanto terminava seu mate com menta.
---
Piiii. Era o celular dele.
Olá! Foi ótimo lhe ver hoje. Fazia tempo que eu não tomava aquele mate. Se estiver afim de ir lá de novo me avise, ok? Beijos.
Ele guardou o celular e sorriu.